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Eduardo Mahon

Editor Geral

EDITORIAL

Pixé de novo! Pixé pro povo! Publicamos novamente uma edição riquíssima. Convém perguntar: quem avalia essa emulativa afirmação? Será o público? Serão os críticos? Quem terá a mercê de dizer o que é bom e o que é mau? Como toda ciência, os estudiosos da literatura reivindicaram o poder de classificar. No mais das vezes, fantasiam-se de cardeais para canonizar este ou aquele escritor. Terá lógica essa antiga prática? Será possível fugir da sombra dos clássicos? No contemporâneo, ainda resiste os conceitos de “alta literatura” e de “literatura universal”? Esses jogos de poder estão manjados, ninguém se engane. É claro que há escritores melhores que outros e livros de um mesmo escritor mais e menos consistente. No entanto, afirmar desníveis ganhou status de crime. Quem se arriscará a ser condenado por categorizar, por classificar, por escolher, numa palavra, por criticar?


Hoje em dia, os estudos culturais invadiram a praia da crítica literária e querem desnudá-la a todo custo. A palavra de ordem é relativizar. Relativiza-se tudo: o estilo, o tema, a geografia, a história, os personagens. Surgiu conceito contextual de “local de fala”, expressão surrada de tão usada. O cânone passou a ser sinônimo de manifestação de poder, um instrumento incestuoso entre universidades, editoras, mídia e público. Assim como se paga por um lugar ao sol nas prateleiras, pode-se negociar uma boa crítica com recíprocos afagos. Qualquer esboço de qualificar passou a revelar o reverso da medalha: eleição arbitrária, caprichos eletivos, preferências afetivas. Numa palavra: criticar é exercer algum tipo de poder e, se é assim, significa também excluir. O que importa agora não é a qualidade da obra e sim sua utilidade para os estudos literários. Se contempla um segmento temático, serve. Do contrário, está descartada a leitura. Será válido o extremismo? Os cânones morreram? Terão sido resultado da egolatria de um punhado de doutores?


É certo que antologias se assemelham às roletas. Não menos verdadeiro que seleções incluem ou excluem autores com uma enorme dose de alvedrio. Também reconhecemos que os apagamentos históricos de autores e autoras deram-se em razão de posições sociais, intelectuais e políticas. Ninguém é ingênuo a ponto de acreditar na isenção da crítica. Só se inventassem uma máquina de avaliar livros e, nem assim, haveria imparcialidade porque o resultado iria variar conforme os programadores. E então? Os altares serão desmontados? As igrejinhas vão arder? Os santos serão alijados de seus nichos? Resumindo a provocação: será pecado dizer que uma obra é superior à outra? Viveremos uma “criticofobia” contemporânea, destronada pela coordenação de outros saberes. Não será este um processo de terceirização da crítica em favor da antropologia, da sociologia e da filosofia? Sim, porque passou a ser comum criticar não só o autor, mas a crítica e o crítico no contemporâneo divã das relativizações.


Parece-nos curioso o sistemático ataque aos cânones. Sim, curiosa tendência. Não só por essa crítica cheirar à reserva de mercado, não só por proteger bairrismos, mas sobretudo porque a destruição dos cânones passados presta-se para forjar outros cânones. Opera-se uma substituição com a mesma natureza questionada: política, eletiva, arbitrária e afetiva. Noutras palavras: descobre-se um santo para cobrir outro. Os estudos de autores periféricos não costumam canonizá-los, mas antes consagram os egocêntricos estudiosos. Alguns críticos assenhoram-se tanto de autores, de temas ou de segmentos literários que, para destacarem-se, sucumbem à vitimização e às lamúrias. Nessa encruzilhada de caminhos diversos com esquinas iguais, tudo indica que mais vale ser honesto na crítica e afirmar, de antemão, os critérios que serão utilizados. Basta isso: honestidade intelectual. O resto é chororô.

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